quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Plano de ação Nacional para espécies exóticas invasoras

Transformações em ecossistemas, extinção de espécies nativas, prejuízos para plantações são alguns estragos que a presença de espécies de fora do local podem ocasionar ao meio ambiente. Denominadas de exóticas invasoras, termo definido pela Convenção da Diversidade Biológica (CDB), essas espécies são plantas, animais ou microrganismos que se proliferam sem controle fora de seus habitat, trazendo riscos à biodiversidade e até mesmo aos seres humanos.


Algumas espécies desse grupo possuem ciclo reprodutivo muito rápido, o que as tornam verdadeiras pragas para a região em que se firmam. Recursos naturais, que antes poderiam ser suficientes para o bem-estar de todas as espécies de determinado habitat, passam a não suprir mais as necessidades nessas regiões, após as bioinvasões. Esse desequilíbrio ecossistêmico pode causar a morte de espécies nativas e provocar até mesmo a sua extinção, no caso das endêmicas (exclusivas de um determinado local).

A invasão se deve principalmente à ação humana, como, por exemplo, o comércio internacional de animais de estimação e plantas ornamentais, a partir da introdução de espécies para criação ou psicultura (criação de peixes); ou pelo transporte não intencional, como a água de lastro, processo pelo qual os tanques dos navios captam água do mar para garantir a segurança operacional e a estabilidade e que acaba possibilitando a captura e o transporte acidental de espécies exóticas. As mudanças climáticas, o desmatamento e a degradação de áreas verdes também são fatores que tornam os ecossistemas suscetíveis a bioinvasões.


Proteger os ambientes naturais dessas espécies é considerado um dos principais desafios para ambientalistas do mundo inteiro. Como ação estratégica, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) se reuniram para elaborar os Planos Nacionais de Controle e Monitoramento de Espécies Exóticas Invasoras. Os PANs pioneiros foram voltados para as espécies de javalis-europeus (Sus scrofa), e para as de coral-sol (Tubastraea coccinea e T. tagusensis)

Os Planos de Ação Nacional para a Conservação das Espécies Ameaçadas de Extinção ou do Patrimônio Espeleológico (PAN) são políticas públicas, pactuadas com a sociedade, que identificam e orientam as ações prioritárias para combater as ameaças que põem em risco populações de espécies e os ambientes naturais e assim protegê-los. 


O Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Primatas da Mata Atlântica e da Preguiça-de-Coleira da (PAN PPMA) desenvolvido em 2018 contempla 13 espécies ameaçadas de extinção e tem como objetivo geral "Aumentar o habitat e reduzir o declínio das populações de primatas e preguiça ameaçados da Mata Atlântica em cinco anos" e como visão de futuro "Todos os primatas e preguiças da Mata Atlântica com populações viáveis e protegidas em seus habitats naturais, em uma sociedade comprometida com sua conservação". O PAN PPMA é composto por SEIS objetivos específicos com vigência até 2023.

O PhD. Carlos Ramón Ruiz Miranda, professor associado da Universidade Estadual Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) e coordenador do Setor de Etologia, Reintrodução e Conservação de Animais Silvestres (SERCAS), faz parte do PAN para a Conservação dos Primatas da Mata Atlântica e da Preguiça-de-Coleira como articulador de ações em colaboração com a Associação Mico Leão Dourado (AMLD). Essa parceria busca  encontrar soluções de manejo que protejam espécies nativas e controlem ou erradiquem espécies exóticas invasoras. O planejamento de manejo visa implementar projetos de restauração ecológica para conexão de fragmentos ou ampliação de habitat; realizar manejo populacional in situ de mico-leão-dourado, de acordo com as recomendações do GAT; propor a adequação do arcabouço legal relativo ao manejo, controle e destinação de populações alóctones e híbridas com impacto nas espécies ameaçadas de extinção, incluindo autorização de remoção – inclusive com eutanásia ou esterilização – dos invasores e híbridos decorrentes de introduções e de manejo inadequado em cativeiro; refinar chave de decisão para orientar ações de manejo para controle/erradicação de populações invasoras, incluindo destinação dos espécimes manejados de populações alóctones e híbridas decorrentes de introduções; diagnosticar fatores relacionados ao estabelecimento de novas populações invasoras; desenvolver ações de sensibilização e educação ambiental com relação ao tráfico, uso, caça e apanha de animais silvestres e com relação aos impactos dos animais domésticos, com foco nas espécies alvo do PAN e elaborar e divulgar de forma integrada informações sobre as doenças que impactem os táxons-alvo. 

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Espécies invasoras estão entre as maiores vilãs da biodiversidade


    Difícil imaginar que o mico-de-cheiro, o sagui-estrela, o gato e o coral-sol (comum na Ilha Grande) representem perigo a animais e plantas que vivem ao seu redor. Mas eles e outras 11 mil espécies, quando fora de seu habitat, representam a segunda maior ameaça à biodiversidade mundial (a primeira é a destruição de habitat), segundo um relatório da ONU.

    Combater as espécies invasoras, como são conhecidas, é uma missão árdua. Levadas para ambientes onde não têm predadores, elas proliferam e se tornam um pesadelo para plantas e animais nativos - inclusive espécies ameaçadas de extinção. Os invasores caçam espécies nativas e competem com elas por alimento e espaço.

   É difícil controlar as espécies invasoras. Elas quase sempre são introduzidas - inadvertidamente ou não - pelo homem. E a maioria das pessoas desconhece que aquelas plantas e animais tão bonitos tenham se tornado uma ameaça ambiental. Não são todos que entendem, por exemplo, que no Rio saguis precisam ser capturados e removidos para locais onde não representarão uma ameaça a outras espécies. Ou que gatos domésticos não devem andar por florestas.

    " A maioria das pessoas desconhece que aquelas plantas e animais tão bonitos tenham se tornado uma ameaça ambiental. No Rio, saguis precisam ser capturados e removidos para locais onde não representarão uma ameaça a outras espécies. Gatos domésticos não devem andar por florestas "

Sagui invasor coloca em risco ave nativa do Rio

   Maio trouxe boas notícias para o formigueiro-do-litoral, a quarta ave mais ameaçada de extinção da Terra. Dois de seus maiores predadores, o mico-estrela e o sagui-de-tufo-branco começam a ser controlados em Saquarema. Os primatas, originários do Cerrado e da Mata Atlântica nordestina, têm sido removidos das áreas de proteção ambiental por cientistas da Uerj, juntamente com o Inea e apoio da Save Brasil (BirdLife International). A intervenção foi necessária para garantir o futuro do pássaro, cujo habitat é uma faixa com pouco mais de 70 quilômetros, entre Búzios e Saquarema.

  Além dos saguis predadores, o formigueiro-do-litoral também precisa enfrentar a destruição do habitat, decorrente da especulação imobiliária - lamenta a ecóloga Maria Alice Alves, coordenadora de pesquisas. - Levamos os saguis para um centro de primatas mantido pelo governo estadual, onde não representarão mais uma ameaça e serão bem tratados. O mico-estrela e o sagui-de-tufo-branco estão provavelmente se hibridizando na região. As pessoas devem ser alertadas dos riscos da soltura desses animais em áreas onde naturalmente não ocorrem, como é o caso da restinga onde vive o formigueiro-do-litoral. A remoção de um grupo de saguis é o primeiro passo, mas é necessário dar continuidade à remoção dos invasores.

  Certas espécies de primatas se tornaram uma ameaça para a fauna nativa do Rio, mesmo aquela supostamente protegida por unidades de conservação. Na Reserva de Poço das Antas, próximo a Silva Jardim, um sagui proveniente do Cerrado compete com o vulnerável mico-leão-dourado, roubando um espaço que seria exclusivo desta espécie.

  A remoção de animais e plantas invasoras tem resultados concretos, segundo a Convenção sobre Diversidade Biológica, vinculada à ONU. Livres de seus concorrentes, os mamíferos veem aumentar sua chance de sobrevivência em 5% - entre as aves, este índice é o dobro.

  As espécies invasoras são uma ameaça silenciosa - alerta Helena Bergallo, do Departamento de Ecologia da Uerj. - Quando se adaptam a um ecossistema diferente do seu, elas se desenvolvem sem encontrar limites à sua expansão. Ali não há, como em seu habitat, parasitas nem predadores que contenham aquela população, um desafio com que as espécies nativas precisam conviver.

  Nas ilhas, onde animais e plantas estão isolados - e, portanto, menos acostumados à competição -, as espécies nativas são mais vulneráveis. Nesses ambientes, invasores são a principal causa de redução da biodiversidade.

   Um dos casos mais devastadores é o coral-sol, espécie do Pacífico que chegou à Ilha Grande 20 anos atrás e já é encontrada até em Salvador. Sua reprodução, mais acelerada do que a de espécies nativas, e seus hábitos alimentares deslocam outros animais dos costões.

   É uma espécie com crescimento exponencial, que desestrutura as comunidades de costões rochosos - ressalta Joel Creed, do Departamento de Ecologia da Uerj e coordenador do Projeto Coral-Sol. - O animal, que pegou carona em plataformas de petróleo para chegar à Ilha Grande, tornou-se um problema nacional.

   O Projeto Coral-Sol, patrocinado pela Petrobras, quer financiar a coleta dos animais e seu uso como artesanato, e se livrar dos invasores em 20 anos. Além de virem incrustadas em navios, as espécies marinhas podem aportar em áreas desconhecidas misturadas à água de lastro, usada como contrapeso em embarcações. Embora a legislação obrigue a troca desta água antes da chegada ao litoral, a medida não costuma ser seguida - e tampouco fiscalizada.

  Estas espécies, no mar ou em terra firme, são agressivas e colonizadoras de ambientes novos - explica Silvia Ziller, engenheira florestal e diretora-executiva do Instituto Hórus.

  Sediado em Florianópolis, o Hórus é especializado em traçar iniciativas de combate a espécies invasoras - trabalho que faz, atualmente, para dois governos sul-americanos (Uruguai e Colômbia), seis estados brasileiros e duas prefeituras. E a clientela tende a aumentar. As mudanças climáticas, segundo os pesquisadores, prometem mexer com a distribuição de animais e plantas nativos, dando ainda mais espaço para as invasoras se estabelecerem.

  Alterações de temperatura farão com que as espécies sejam obrigadas a mudar - diz Michele Dechoum, bióloga do Hórus. - Muitas podem concentrar-se em uma área menor à que ocupam atualmente. Todo o espaço vago será ocupado pelas invasoras.

  Essas espécies também tomarão posse de regiões degradadas por fenômenos naturais, como furacões e enchentes - que, segundo modelos climáticos, também devem ocorrer com maior frequência nas próximas décadas.

   O planeta vai se tornar ainda mais vulnerável a espécies invasoras - afirma Helena. - Este é um motivo para chamarmos tanta atenção para elas. Pode ser mais difícil combatê-las do que lutar contra o desmatamento, por exemplo, que produz estragos visíveis.

  Os invasores, além do desfalque à biodiversidade, doem o bolso das principais economias do mundo. Segundo a ONU, essas espécies já provocam prejuízos de US$ 1,4 trilhão, o equivalente a 5% do PIB global, em áreas como agricultura, comércio e turismo. 

Fonte: O Globo Online

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Vítimas e Vilões: O problema dos saguis introduzidos no Rio de Janeiro

     É comum ver saguis nas florestas, praças e ruas do Rio de Janeiro. Apesar de serem vítimas do tráfico de animais, esses macaquinhos também são vilões para a fauna local devido à disputa por alimentos e à disseminação de doenças. O tema é abordado em artigo na CH 283. 

    Ao acompanhar micos-leões-dourados (Leontopithecus rosalia) em seu ambiente, qualquer pessoa pode ter uma experiência semelhante à vivida por um dos autores (Ruiz-Miranda) enquanto observava seu comportamento.
     Ele olhava para cima, em direção à parte inferior da copa das árvores, com uma imagem pré-formada em sua mente. Ao avistá-los, checou a presença de todos os micos do grupo, já observados antes, e começou a registrar o que faziam, comparando as anotações com um inventário de comportamentos (um etograma) previamente elaborado e bem memorizado. Então, não reconheceu as atividades de um dos micos, cujas atitudes lembravam a de uma criança brincando com um ‘amigo imaginário’.
    O pesquisador olhou novamente, tentando entender. Até perceber que outro bicho estava lá, com o corpo – de cabeça para baixo e inclinado – quase oculto contra o tronco da árvore. A equipe de campo notou sua surpresa e todos olharam para o local que ele fixava, até que alguém disse: “Mico-estrela”.
Esse é o nome popular do sagui que brincava com um jovem mico-leão-dourado. O pesquisador perguntou: “Eles não são daqui, certo?” E ouviu a resposta: “Eles estão aqui, não estão?”. Esse diálogo praticamente resume o estado atual da situação: o que fazer com esses saguis?

Vítimas do tráfico

    A presença abundante de saguis do gênero Callithrix em regiões onde não são nativos é um problema nacional. Esses primatas são introduzidos fora das áreas naturais de ocorrência como resultado do tráfico ilegal de animais selvagens no Brasil.
   Filhotes novos e jovens adultos desses primatas são capturados nas matas onde vivem e transportados para grandes cidades, para satisfazer o comércio nacional e internacional.
   Os compradores, em zonas rurais ou urbanas, os liberam em suas fazendas ou jardins. Os transportadores também os soltam às margens das estradas, quando são espécimes crescidos e menos dóceis. E a própria polícia, muitas vezes, confisca os animais de seus ‘donos’ e os liberta à beira de florestas.
     No estado do Rio de Janeiro, que segundo as pesquisas já realizadas parece ser o mais afetado, o problema é evidente há décadas. Os animais liberados aclimataram-se ao novo ambiente, principalmente em áreas florestadas, e formaram populações que vêm ocupando mais território e disputando alimento com espécies locais.


            Os saguis introduzidos na bacia do rio São João, no interior do Rio de Janeiro,                são encontrados na maioria dos fragmentos florestais ocupada atualmente por micos-leões-dourados. (imagem: Laboratório de Ciências Ambientais/ Uenf)


     Para avaliar se a presença desses primatas ‘intrusos’ representava um problema para a conservação dos micos-leões-dourados, o Laboratório de Ciências Ambientais, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), em parceria com a Associação Mico-Leão-Dourado, iniciou em 1998 uma pesquisa com os saguis presentes na área de proteção ambiental (APA) da bacia do rio São João, uma das áreas de endemismo do mico-leão-dourado no interior do Rio de Janeiro.
       Diversas questões direcionaram o projeto: Que espécies estão presentes? De onde vieram? A área territorial que ocupam expandiu-se a partir da cidade do Rio de Janeiro? Sua população está estabelecida? Qual o seu estado físico? Eles competem por recursos com os micos-leões-dourados? O que fazer com eles?
         O estudo vem sendo desenvolvido por uma equipe de campo do laboratório e da Associação Mico-Leão-Dourado, organização não governamental que tem como objetivos proteger essa espécie e a biodiversidade da mata atlântica.


Confira o artigo na íntegra acessando o link: http://cienciahoje.org.br/artigo/vitimas-e-viloes/